Reflexão!

 

 

 

 

 

 

 

Do livro Meu Pé de Laranja Lima, de José Mauro de Vasconcelos.

    José Mauro de Vasconcelos, escritor,  romancista e poeta brasileiro.

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Ausência, de Vinícius de Moraes

Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar os teus olhos que são doces
Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres eternamente exausto
No entanto a tua presença é qualquer coisa como a luz e a vida
E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz a tua voz

Não te quero ter porque em meu ser tudo estaria terminado
Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados
Para que eu possa levar uma gota de orvalho desta terra amaldiçoada
Que ficou sobre a minha carne como uma nódoa do passado

Eu deixarei… tu irás e encostarás a tua face em outra face
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, porque eu fui o grande íntimo da noite
Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa
Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço
E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado

Eu ficarei só como os veleiros nos portos silenciosos
Mas eu te possuirei mais que ninguém porque poderei partir
E todas as lamentações do mar, do vento, do céu, das aves, das estrelas
Serão a tua voz presente, a tua voz ausente, a tua voz serenizada

 

Vinícius de Moraes foi um poeta, dramaturgo, cantor e compositor brasileiro, jornalista e diplomata. Autor de vários livros, poemas e canções. Livros como O caminho para a distância. Forma e exegese, Novos poemas, Antologia poética, Para viver um grande amor dentre outros.

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Além da Terra, além do Céu, Drummond

Além da terra, além do céu
no trampolim do sem-fim das estrelas,
no rastro dos astros,
na magnólia das nebulosas.
Além, muito além do sistema solar

até onde alcançam o pensamento e o coração,
vamos!
vamos conjugar
o verbo fundamental essencial
o verbo transcendente, acima das gramáticas
e do medo e da moeda e da política,
o verbo sempre amar
o verbo pluriamar,
razão de ser e viver.

Carlos Drummond de Andrade foi um poeta, contista e cronista brasileiro. Autor de Antologia Poética, Alguma Poesia, Boca de Luar, Claro Enigma, dentre outros.

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Despertar, de Aglaia Souza

Doce segredo se espalha

sob o solo, entre as paineiras

Suave melodia acorda

as flores das buganvílias.

Secreto código solta

o perfume das roseiras.

Um terno convite tece

as cores das espatódeas.

Um relógio dita as horas

do despertar dos ipês.

A batuta rege o tempo

do romper dos flamboyants.

Um riacho murmureja

nos subterrâneos do barro.

A vida risca seus tons

em galhos secos, cerrados.

Do livro Poemas para Brasília – antologia, de Joanir de Oliveira. Poesia de Aglaia Souza, poetisa, cronista e escritora brasiliense.

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Saudade, de Fernando Pessoa

Eu amo tudo o que foi
Tudo o que já não é
A dor que já não me dói
A antiga e errônea fé
O ontem que a dor deixou
O que deixou alegria
Só porque foi e voou
E hoje é já outro dia.

Fernando Pessoa poeta, escritor, crítico literário, inventor, tradutor, filósofo e comentarista político português. Autor de livros como O livro do desassossego, O eu profundo e os outros eus, dentre outros.

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A surpresa, de Clarice Lispector

Olhar-se ao espelho e dizer-se deslumbrada:

Como sou misteriosa.

Sou tão delicada e forte.

E a curva dos lábios manteve a inocência.

Não há homem ou mulher que por acaso não se tenha olhado ao espelho

e se surpreendido consigo próprio.

Por uma fração de segundo a gente se vê como a um objeto a ser olhado.

A isto se chamaria talvez de narcisismo, mas eu chamaria de: alegria de ser.

Alegria de encontrar na figura exterior os ecos da figura interna: ah, então é verdade que eu não me imaginei, eu existo.

 

Clarice Lispector foi uma escritora naturalizada brasileira. Autora de vários ensaios,  crônicas, livros como Perto do Coração Selvagem, A descoberta do mundo,  A hora da estrela, Laços de família, Minhas queridas e muitos outros.

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