Afinal, sempre de J. G. de Araújo Jorge

Sou tua partida
e tua chegada
e momento de dor
e de alegria,
o lenço que acena,
o riso que espera

Quando não és presença
Em todos os sentidos
Continuas comigo:
És saudade.

Sou tua partida
E tua chegada…
Inventamos distâncias
Para dar um nó cego
Neste amor.

J. G. de Araújo Jorge, foi um poeta e político brasileiro. Autor de livros como Meu Céu Interior, Amo, Trevos de Quatro Versos, dentre outros.

A grandeza do mar, de Paulo Roberto Gaefke

A grandeza do mar, de Paulo Roberto Gaefke

Você sabe por que o mar é tão grande?
Tão imenso? Tão poderoso?
É porque teve a humildade de colocar-se alguns centímetros
abaixo de todos os rios.
Sabendo receber, tornou-se grande.
Se quisesse ser o primeiro, centímetros acima de todos os rios,
não seria mar, mas sim uma ilha.
Toda sua água iria para os outros e estaria isolado.
A perda faz parte.
A queda faz parte.
A morte faz parte.
É impossível vivermos satisfatoriamente.
Precisamos aprender a perder, a cair, a errar e a morrer.
Impossível ganhar sem saber perder.
Impossível andar sem saber cair.
Impossível acertar sem saber errar.
Impossível viver sem saber morrer.
Se aprenderes a perder, a cair, a errar, ninguém mais o controlará.
Porque o máximo que poderá acontecer a você é cair, errar e perder.
E isto você já sabe.

Bem aventurado aquele que já consegue receber com a mesma naturalidade
o ganho e a perda, o acerto e o erro, o triunfo e a queda, a vida e a morte.

Retirado do livro “Quando é preciso Viver”

 

A meus filhos, de Flora Figueiredo


Estou aqui ao lado, 
à margem de seu caminho, 
vendo você passar. 
Quero que vá sozinho 
mas me mantenho por perto. 
Se o rumo é certo, 
me aprumo e aplaudo; 
se é via tortuosa, 
jogo-lhe aos pés uma rosa 
pra que desviando dela 
você chegue a outro lugar; 
se a sombra é fria, 
mando-lhe um beijo quente; 
se o chão queima do sol nascente, 
estendo-lhe a poesia 
para que o possa atenuar, 
se não houver alimento, 
peço ao vento 
sementes que lhe tragam vida. 
Para a sede, 
roubo do céu a lágrima caída da madrugada. 
Mas se você não precisar de nada, 
ainda assim eu estarei vigiando, 
escondida talvez atrás de um querubim. 
Abençoarei sua vida e sua estrada, 
mesmo que já esteja transformada 
na forma clara e casta de um jasmim. 
                                                                     “Florescência”. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1987.

Ser e estar, de Mario Quintana

A nuvem, a asa, o vento,
a árvore, a pedra, o morto…

tudo o que está em movimento,
tudo o que está absorto…

aparente é esse alento
de vela rumando um porto

como aparente é o jazimento
de quem na terra achou conforto…

pois tudo o que é está imerso
neste respirar do universo

– ora mais brando ora mais forte
porém sem pausa definida –

e curto é o prazo da vida

e curto é o prazo da morte.

A linha e o nó, de Dorly Follmann

No fim

Da linha

um nó

fininho

que só!

De que vale

a linha

sem nó?

[um só!]

E a linha

puxando

o nó

com força,

com raiva…

andando

por novos

caminhos…

E fura

e une

e amarra

De um lado

para o outro…

E o nó

na espera,

escuta

o roque

dos dentes

da linha

Roendo

o pano

com fúria…

[que dó!]

E a linha

fininha,

fiando

furando…

se mata,

segura,

no furo

passando…

Retirado do livro Cantos de Cigarra: ensaiando primaveras, de Dorly Follmann, 2015.

Assim eu vejo a vida, de Cora Coralina

A vida tem duas faces:
Positiva e negativa
O passado foi duro
mas deixou o seu legado
Saber viver é a grande sabedoria
Que eu possa dignificar
Minha condição de mulher,
Aceitar suas limitações
E me fazer pedra de segurança
dos valores que vão desmoronando.
Nasci em tempos rudes
Aceitei contradições
lutas e pedras
como lições de vida
e delas me sirvo
Aprendi a viver.

Cora Coralina, pseudônimo de Anna Lins dos Guimarães Peixoto Bretas. Poetisa e contista brasileira, da Cidade de Goiás, 1889-1985.