Gosto quando me falas de ti, de J. G. de Araújo Jorge

Gosto quando me falas de ti... e vou te percorrendo e vou descortinando a tua vida na paisagem sem nuvens, cenário de meus desejos tranquilos, Gosto quando me falas de ti... e então percebo que antes mesmo de chegar, me adivinhavas, que ninguém te tocou, senão o vento que não deixa vestígios, e se vai desfeito em carícias vãs... Gosto quando me falas de ti... quando aos poucos a luz vasculha todos os cantos de sombra, e eu só te encontro e te reencontro em teus lábios, apenas pintados, maduros, mas nunca mordidos antes da minha audácia. Gosto quando me falas de ti... e muito mais adiantas em teus olhos descampados, sem emboscadas, e acenas a tua alma, sem dobras, como um lençol distendido, e descortino o teu destino, como um caminho certo, cuja primeira curva foi o nosso encontro. Gosto quando me falas de ti... porque percebo que te desnudas como uma criança, sem maldade, e que eu cheguei justamente para acordar tua vida que se desenrola inútil como um novelo que nos cai no chão..." Do livro Quatro Damas, 1965. J. G. de Araújo Jorge, foi um poeta e político brasileiro. Autor de livros como Meu Céu Interior, Amo, Trevos de Quatro Versos, Os mais belos poemas que o amor inspirou, dentre outros.

Tricô e poesia – Mate simples, por Isabella Vieira de Bem

Os fios tecem os dedos das tricoteiras. Ágeis, os pontos correm carreiras Nas tramas de todas as dores. Nos dramas, em todas as cores, Tece, o artesão, a fantasia, ... Veste a barra do dia, Cobre a nudez da noite E as agulhas, pouco à vontade, Assinam com ponto final: Mate simples   Blog tricot na veia

Uma prece ao melhor do teu ser, de Wagner Borges

Que esses escritos levem Amor ao teu coração.Que tudo que é trevoso seja abraçado pela tua luz.Que te encantes com o presente da vida.Que tua alma seja curada na luz.Que teus pensamentos sejam justos.Que tuas mãos sejam curadoras.Que teu trabalho te dignifique.Que sejas querido na prece dos outros.Que teu olhar revele o brilho do Eterno.Que tenhas consciência da Sagrada Presença.Que vejas sempre algo belo, mesmo em um dia cinzento.Que não deixes passar um grande Amor.Que teu coração seja generoso como o Sol.Que teus passos sejam honrados.Que a perda de alguém querido não te aniquile.Que os reveses de tua vida sejam lições de sabedoria.Que aprecies muitas canções, e te encantes com elas.Que não tenhas medo de Amar.Que tuas emoções não te sejam um fardo.Que honres teus pais e teus ancestrais.Que a chuva lave tuas mágoas e te renove o viver.Que saibas te abrir, para a vida te dizer algo justo.Que teus lábios estejam sempre fechados para queixumes.Que, por mais que te atentem, não traias o teu coração.Que saibas perdoar, aos outros e a ti mesmo.Que tenhas sabedoria para corrigir teus erros.Que o mal nunca faça morada em teu coração.Que não valorizes aquilo que rebaixa o teu espírito.Que nada te afaste da luz e do amor verdadeiros.Que estejas sempre em um círculo de luz. Paz e Luz. Amor e Presença.

O lugar de ser feliz, de Joanyr de Oliveira.

Deus abriu a janela do mundo e nela projetou o céu do cerrado. Acendeu o diamante azul do dia na esplanada do destino. As nuvens saem do chão, numa explosão álacre de âmbar. A lua é um pássaro de bruma na textura esvoaçante. Pode-se descansar do mormaço num banco de concreto, olhando o trânsito da Asa Sul, na fronteira da 307, à sombra das horas, na liberdade da vida sem perigos. Ninguém me perguntará onde moro ou o que faço nesta quadra de Brasília, em frente a uma biblioteca, no espaço livre da vida. Poema transcrito da antologia “Poemas para Brasília”, de Joanyr de Oliveira. Márcio Catunda é escritor, poeta, compositor e diplomata brasileiro, autor de Noites Claras, No Chão do Destino, A Essência da Espiritualidade dentre outros.

Pequenas certezas por Clarissa Corrêa

Eu não duvido do poder da música. Em um dia preto e branco ela me colore. Em um momento de tristeza ela traz de volta um meio sorriso. Em uma situação delicada ela me socorre.Eu não duvido do poder do abraço. Ele transforma corações. Aproxima uma alma da outra. É a ponte para o reencontro. Traz de volta a paz. Remove qualquer impureza do espírito.Eu não duvido do poder da chuva. Ela manda embora toda a desgraça, desamor e sujeira. Deixa tudo mais puro e renovado.Eu não duvido do poder de um sorriso. Ele quebra qualquer gelo, desmonta uma cara feia, desarma quem trouxe munição no peito. Eu não duvido do poder do olho no olho. Ele traz a confiança, a vontade de acreditar, a certeza de que ainda existe salvação.Eu não duvido do poder do sol. Ele traz a saúde, devolve a beleza e de quebra ainda esquenta quem já congelou por dentro há tempos.Eu não duvido do poder do perdão. Ele faz as cicatrizes ficarem mais suaves, devolve o viço da pele, ilumina o dia e o passado.Eu não duvido do poder do amor. Ele traz o apoio, oferece o suporte, segura forte a mão, ajuda a segurar qualquer fardo, por mais pesado que possa parecer.Eu não duvido do poder da fé. Ela ampara, acalenta, acolhe, aconchega, nos pega no colo e cantarola uma linda canção de ninar.Eu não duvido do poder da vida. Ela ensina, reconstrói, resgata, ajuda, reencontra. E cura.

Meu Destino, de Cora Coralina

Nas palmas de tuas mãos leio as linhas da minha vida. Linhas cruzadas, sinuosas, interferindo no teu destino. Não te procurei, não me procurastes – íamos sozinhos por estradas diferentes. Indiferentes, cruzamos Passavas com o fardo da vida… Corri ao teu encontro. Sorri. Falamos. Esse dia foi marcado com a pedra branca da cabeça de um peixe. E, desde então, caminhamos juntos pela vida…

Reflexão!, de Rubem Alves

"A vida tem sua própria sabedoria. Quem tenta ajudar uma borboleta a sair do casulo a mata. Quem tenta ajudar o broto a sair da semente o destrói. Há certas coisas que têm que acontecer de dentro para fora" De Rubem Alves

Na ribeira deste rio, de Fernando Pessoa

Na ribeira deste rio Ou na ribeira daquele Passam meus dias a fio. Nada me impede, me impele, Me dá calor ou dá frio. Vou vendo o que o rio faz Quando o rio não faz nada. Vejo os rastros que ele traz, Numa sequência arrastada, Do que ficou para trás. Vou vendo e vou meditando, Não bem no rio que passa Mas só no que estou pensando, Porque o bem dele é que faça Eu não ver que vai passando. Vou na ribeira do rio Que está aqui ou ali, E do seu curso me fio, Porque, se o vi ou não vi. Ele passa e eu confio.   Também cantada por Dori Caymmi. Foi música da novela Sinhá Moça, da Globo. Fernando Pessoa poeta, escritor, crítico literário, inventor, tradutor, filósofo e comentarista político português. Autor de livros como O livro do desassossego, O eu profundo e os outros eus, dentre outros.